APRESENTAÇÃO
Roberta Nioac Prado[1]
Assim como o livro “Aspectos Relevantes da Empresa Familiar – Governança e Planejamento Patrimonial Sucessório”, da Coleção Direito em Contexto, lançado em 2013 pela Editora Saraiva em parceria com a Fundação Getulio Vargas/Direito GV, este livro é resultado de encontros mensais que ocorrem na Escola[2] desde 2010, quando teve início o Grupo de Estudos de Empresas Familiares (GEEF) da Direito GV[3].
Nesses encontros, realizados na segunda 3ª feira de cada mês, durante duas horas e meia, um grupo de profissionais de várias áreas distintas, relacionadas à governança corporativa, familiar e ao planejamento sucessório da gestão e do controle de empresas familiares, encontra-se para debater casos concretos e variados temas envolvendo questões de Direito, Administração, Psicologia e outros no âmbito de empresas familiares e de famílias empresárias.
A partir dos debates multidisciplinares realizados nesses encontros, textos são escritos para a publicação.
Esse livro contém 18 artigos, tratando dos casos apresentados nos encontros, ou de questões legais, administrativas, econômicas, psicológicas que os envolvem e foram discutidas pelo grupo.
O primeiro artigo “Família Matarazzo: as práticas aparentes de governança e o planejamento sucessório de duas gerações” foi escrito por Marcelo Rodrigues e Renato Vilela, o primeiro formado em Administração de Empresas pelo IBMEC-RJ com MBA em Gestão de Negócios para o setor de Óleo e Gás pelo IBP, e o segundo, mestre em Direito dos Negócios pela Direito GV, bacharel em Direito pela Faculdade de Direito do Mackenzie e bacharel em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo – USP.
Os autores relatam, pormenorizadamente, a evolução do grupo empresarial desta importante família na história econômica e industrial brasileira, desde sua origem em 1890 até sua derrocada que se deu a partir de 1977, com a morte do Conde Francisco Matarazzo Junior, filho do fundador do grupo. O texto foca nas práticas de governança corporativa adotadas em conjunto com os planejamentos sucessórios que buscaram dar conta da transmissão do controle do grupo e de sua gestão ao longo de três gerações.
O segundo artigo, “O dilema das gerações”, dividido em dois tópicos, a saber: (i) quem faz parte do núcleo familiar, e (ii) o dilema da transferência de comando nas empresas familiares, foi escrito pelos advogados e sócios Luiz Kignel e Marcia Setti Phebo, o primeiro especializado em Direito Privado pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, em Direito Processual Civil pelo COGEAE/Faculdade de Direito da PUC/SP e em Mediação e Arbitragem pela Escola de Direito da Fundação Getúlio Vargas, especialista nas áreas do Direito de Família, Sucessório e Imobiliário e a segunda especializada em Mercado de Capitais e Financeiro pela Escola de Administração de Empresas de São Paulo da FGV – Fundação Getulio Vargas; em Direito Tributário pelo CEEU – Centro de Estudos de Extensão Universitária, e com ampla experiência na área societária.
O texto aborda, de forma didática e com base em situações atuais, o questionamento que tem surgido de maneira recorrente em famílias empresárias sobre quem, para efeitos de planejamento sucessório na gestão e na propriedade da empresa, deve integrar o núcleo familiar, ou seja, qual é o novo conceito de família, na lei, na jurisprudência e no seio das famílias empresárias brasileiras. Em seguida, o texto aborda os principais dilemas que um empresário em geral se depara quando decide dar início a um planejamento sucessório organizado da empresa que controla e administra.
O terceiro artigo, “Autoridade, papel e temporalidade na empresa familiar: uma aproximação a partir do modelo Group Relations Conferences – GRC (Tavistock)” foi escrito por Valéria Cecilia Dorado Lisondo e Hector Rafael Lisondo, ela Psicóloga, formada pela PUC-SP e pós-graduada em Administração da Empresas (ESADE Business School- Barcelona e FGV-SP), além de Membro do GRC- Argentina (www.grouprelations.com.ar) e ele engenheiro, formado pela UBA – Buenos Aires, Psicólogo (USF-SP); Mestre em Qualidade (UNICAMP) e Doutor em Engenharia (USP).
Os autores discorrem sobre três importantes variáveis que influenciam a dinâmica da organização do grupo familiar e influenciam nos resultados econômicos e na sustentabilidade da organização, bem como na qualidade de vida de seus membros e colaboradores, quais sejam: o papel, a autoridade e a temporalidade na empresa. O estudo baseia-se em uma abordagem psicodinâmica e nas premissas da metodologia do Group Relations Conferences, que é explicada ao longo do texto.
O quarto artigo “Empresas familiares: uma abordagem grupal” é escrito por Marcel Paranhos Dias, profissional da área de desenvolvimento humano atuando há mais de 18 anos em educação de adultos e da família empresária com foco em Sucessão, Desenvolvimento de Habilidades Interpessoais, Executive Coach, Consultoria de Terceira Parte, Construção de Equipes e Change Management, didata em Processos Grupais formado pela Sociedade Brasileira de Dinâmica dos Grupos e Membro da equipe mundial de Trainers.
O texto, que também aborda a família enquanto um grupo, levanta questões objetivas e subjetivas acerca das dinâmicas que encampam uma família empresária, tais como suas necessidades, desejos, sentimentos, mecanismos de defesa e até mesmo a sobrevivência dos diferentes membros do grupo da família, o que pode contribuir para sua união ou para sua desintegração.
Ainda no campo da psicologia, o quinto artigo, “Identidade e sucessão: interface da psicologia com as empresas familiares”, foi escrito por Celia Brandão, psicóloga formada pela Universidade de São Paulo, analista pela Sociedade Brasileira de Psicologia Analítica, que atua na área de psicologia clínica há 37 anos, atendendo adolescentes, adultos, casais e famílias como psicoterapeuta, psicanalista e mediadora de conflitos na atividade clínica em consultório, assim como também em psicologia institucional e organizacional.
A autora trata da sucessão em empresas familiares partindo de conceitos psicanalíticos acerca da identidade do ser humano, identidade que se desenvolve desde o seu nascimento até a sua morte. O texto passa por conflitos de identidade, individuais e da família, recorrentes no mundo contemporâneo globalizado, nas famílias e no contexto familiar atual, bem como em uma empresa e no seu processo sucessório, o que envolve questões legais relativas à herança, e tantas outras de cunho emocional e psíquico.
O sexto artigo “Governança moderna e gestão avançada como suporte a um ousado projeto de crescimento – Dori Alimentos”, é escrito por Carlos Bordin Barion, presidente da Dori Alimentos, empresa pertencente à sua família, que conta com 2400 empregados (2013). O autor é zootecnista e atua como executivo da Dori desde 1997. Em janeiro de 2011 assumiu a presidência, sucedendo a João Baptista Barion, seu pai.
O texto relata a história desta empresa familiar fabricante de doces e outras guloseimas, que teve início em 1946 no interior de São Paulo e que passou por várias fases no desenvolvimento de sua governança corporativa e familiar, tais como tratar profissionalmente questões relacionadas à remuneração do capital da família, dos gestores da empresa, familiares ou não, bem como de sua política de investimento e reinvestimento de lucros, passando pela redação de acordo de sócios, formação de holdings familiares, criação de conselho de administração e planos de sucessão da gestão.
O sétimo artigo “Empresa de transporte urbano – um caso de despreparo em sucessão com reflexos significativos na gestão e no resultado da empresa” foi escrito por Telmo Schoeler, administrador formado pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com MBA em Administração de Empresas pela Michigan State University (EUA) e membro de Conselhos de Administração ou Consultivos, de capital aberto e fechado, como, por exemplo, Excelsior, Varig, Selenium, Mercur, Audaces, Araupel, Dec International, Farina, Biguaçú, entre outros.
O caso relatado descreve uma situação rotineira em empresas familiares, qual seja: uma crise profunda com severos reflexos nos seus resultados, causada por uma gestão informal, não profissional, sem controles sistêmicos e, adequada e competente estrutura organizacional. O autor, consultor da família controladora, finaliza relatando as ações corretivas que vem sendo tomadas no caso concreto bem como as possíveis soluções que estão sendo discutidas. Por questões de privacidade e para preservar as pessoas envolvidas, a empresa familiar teve seu nome, o nome de seus sócios e herdeiros modificados.
O oitavo texto, “A importante tarefa de desenvolver acionistas responsáveis”, é da autoria de Mary Nicoliello, psicóloga com MBA Executivo em Gestão de Pessoas e Organizações pela UFRJ e especialista em Direção Estratégica de Empresas Familiares pela Universidad Europea Miguel de Cervantes, com certificação internacional em Coaching Integrado pelo ICI – Integrated Coaching Institute.
A autora, que foi responsável pelo desenvolvimento do programa de familiares na Votorantim Participações, relata a importância de um plano de desenvolvimento da família empresária estruturado em três pilares: a propriedade (controle da empresa e patrimônio familiar), a gestão da empresa e a família em si, para o sucesso e a longevidade da empresa. O foco do texto repousa na governança familiar e expõe, de forma sucinta, em um modelo de desenvolvimento de herdeiros, desde o seu nascimento até a idade adulta.
O nono artigo “Os conselhos de administração, consultivo e familiar” foi escrito por Thomas Michael Lanz, graduado em economia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), mestre em Administração de Empresas pelo Insead (França), ex-executivo e ex-dirigente empresarial das empresas familiares Mangels Industrial, Giroflex, Carbex e Lafer.
O texto trata dos três principais órgãos que em geral consubstanciam o primeiro grande passo para a profissionalização e para o estabelecimento de regras adequadas de governança em uma empresa familiar e em uma família empresária: o conselho de administração e o conselho consultivo, ambos no âmbito da gestão da empresa; e o conselho de família que, no âmbito da família, cuidará de questões importantes relacionadas aos herdeiros e demais membros da família, questões essas que podem de alguma forma impactar a empresa, seu controle ou a sua gestão.
O décimo e o décimo primeiro artigos, quais sejam: “Reflexões sobre o protocolo familiar” e “A modificação do regime de bens e a situação do patrimônio” são escritos em conjunto pelas advogadas especialistas em Direito de Família e das Sucessões e também sócias Maria Fernanda Vaiano Chammas e Renata Ferrara, as duas pós-graduadas (MBA) em Direito da Economia e da Empresa pela Fundação Getulio Vargas de São Paulo e membros do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) e do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (CESA).
No texto as autoras tratam do protocolo familiar, instrumento comum no âmbito da governança da família e que, se bem estruturado, contribui para uma sucessão planejada ao longo de gerações, viabilizando um dos pilares fundamentais na longevidade das empresas, qual seja, regras claras no que respeita o relacionamento dos familiares, e destes com a empresa.
No décimo primeiro texto abordam uma possibilidade legal trazida para o ordenamento jurídico brasileiro com o Código Civil de 2002: a possibilidade de um casal que contraiu matrimônio, por exemplo, no regime de comunhão total de bens, modificar o regime de seus bens para separação total. Ademais, expõem algumas decisões judiciais recentes sobre o tema em questão.
O décimo segundo texto trata da “Gestão patrimonial – o que fazer para proteger seu patrimônio” e foi escrito pelo advogado Marcos Puglisi de Assumpção, também engenheiro pós-graduado em Administração de Empresas – FGV/SP e em Direito Empresarial – PUC/COGEAE.
O autor aborda o histórico e o conceito legal de propriedade, suas limitações e os principais instrumentos que podem ser utilizados em um planejamento patrimonial sucessório, envolvendo ou não empresas. Termina relatando brevemente alguns casos práticos.
O décimo terceiro texto “Consórcio, SCP, SPF e planejamento tributário”, escrito pela tributarista Karem Jureidini Dias, doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo em Direito Tributário, conselheira do CARF e membro da CSRF/MF, cuida de estruturas societárias, conceitos, vantagens e desvantagens da sua adoção em um planejamento tributário e suas respectivas implicações fiscais. Ao longo do trabalho apresenta decisões judiciais e administrativas acerca da adoção casuística dessas estruturas.
O décimo quarto texto “Avaliação e gestão dos ativos intangíveis como diferencial estratégico” é de autoria de Ana Cristina França de Souza (graduada em Engenharia Civil pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ), com pós-graduação em Avaliações de Empresas e Projetos e em Ciências Contábeis pela Escola de Pós-Graduação da FGV – Fundação Getulio Vargas. Certificada pelo CVA – Certified Valuation Analyst para avaliação de empresas e ativos intangíveis, Carlos Magno Sanches (graduado em Finanças pela Anderson University, Carolina do Sul, EUA e com MBA em Finanças pela Ibmec-RJ), Giana Araujo (graduada e mestre em História Social e Econômica pela Universidade Federal Fluminense (UFF), coordenadora do Comitê Brasileiro de Avaliadores de Negócios (CBAN) da ANEFAC, e do setor de Gestão Estratégica da APSIS Consultoria) e Luiz Paulo Cesar Silveira (graduado em Engenharia Mecânica pela Universidade Federal Fluminense (UFF-RJ) e mestre em Administração de Empresas pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (COPPEAD-UFRJ).
Os autores abordam a importância da adequada avaliação de ativos intangíveis, atualmente estratégicos e de grande valor para as companhias: seu lugar na contabilidade e nas demonstrações financeiras das empresas e o processo de identificação desses ativos na estrutura operacional da empresa. Tratam, ademais, das principais formas de se avaliar um ativo intangível empresarial: a abordagem de mercado, a abordagem de custo, a abordagem de renda, o método de dispensa de royalty, o método de fluxo de caixa incremental, o método da segregação do valor dos ativos intangíveis, dos lucros excedentes multiperíodos e a média ponderada dos retornos sobre os ativos.
O décimo quinto artigo “Informações confidenciais e segredo de negócio” é escrito pela advogada Juliana G. Meyer Gottardi, formada pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná, com MBA em Direito da Empresa e da Economia pela FGV, especialização em Contratos Internacionais pela PUC-COGEAE e em Negócios Imobiliários pela FGV-GVPEC.
O texto aborda, sob o enfoque jurídico, o que são informações confidenciais e segredos de negócio, e qual a proteção legal dada a essas informações, notadamente no âmbito da lei da propriedade industrial, do Código de Defesa do Consumidor, da Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), dos Códigos Penal e Civil brasileiros. Finaliza ressaltando a importância de adicionalmente as partes contratarem regras privadas em contratos de confidencialidade e não concorrência.
O décimo sexto artigo “Obrigatoriedade do novo direito contábil, sociedade por ações e sociedade limitada”, é escrito por Edison Carlos Fernandes, advogado tributarista, doutor em direito pela PUC-SP, professor da Direito GV (cursos de pós-graduação da Fundação Getúlio Vargas – FGV), e membro da Academia Paulista de Letras Jurídicas – APJL.
O autor aborda a lei 11.638/2007 que trouxe para a contabilidade brasileira a obrigatoriedade de se adotar normas internacionais de contabilidade, conhecidas em inglês por International Financial Reporting Standards (IFRS). Explica porque tais regras devem ser adotadas não apenas por sociedades anônimas, especialmente as com ações cotadas em Bolsas de Valores, mas por qualquer sociedade empresária brasileira, inclusive as sociedades limitadas de menor porte.
O décimo sétimo artigo “Comentários à oferta de valores mobiliários com esforços restritos por empresas familiares – Instrução CVM n. 476/09” é escrito por Ilene Patricia de Noronha Najjarian, doutora em Direito Comercial pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo – USP e procuradora federal lotada na C.V.M.
A autora busca demonstrar que atualmente as ofertas públicas de valores mobiliários não são mais uma forma de capitalizar-se, privilégio exclusivo de sociedades anônimas de grande porte, podendo ser utilizadas por micro e pequenas empresas, S/A ou Ltda, e inclusive por outros tipos societários previstos no Código Civil Brasileiro.
O décimo oitavo e último artigo, “Filantropia no Brasil e no mundo: uma visão geral” é escrito por Marcos Flavio Azzi e Julianne Nestlehner, o primeiro formado em Administração de Empresas pela FAAP, com MBA em Finanças pela USP, foi sócio da Hedging-Griffo Administradora de Recursos, e atualmente é diretor do Instituto Azzi, que auxilia pessoas físicas de alto poder aquisitivo a atuarem na área de filantropia. Julianne cursa o Mestrado em Administração Pública e Governo da Fundação Getulio Vargas e é assessora de filantropia no Instituto Azzi, onde atua com prospecção de investidores e monitoramento de projetos em andamento.
Os autores tratam da filantropia enquanto investimento social privado, demonstrando que a mesma demanda planejamento estratégico e estruturação profissional, para que se possa fazer o bem da melhor forma possível e com o engajamento necessário para obtenção dos resultados esperados. Expõe a importância do engajamento real e da responsabilidade atual das pessoas físicas de alto poder aquisitivo com os menos favorecidos, e das principais etapas a serem seguidas em uma filantropia “inteligente”, a saber: planejamento, monitoramento e avaliação.
Esperamos, com mais esse livro, contribuir para a reflexão e o aprofundamento desses temas que são tão caros para uma adequada governança corporativa e familiar para todas as nossas empresas familiares e famílias empresárias.
Finalmente, ressaltamos que as opiniões aqui expressas são de responsabilidade de seus autores e não necessariamente representam a opinião da coordenadora, do GEEF, ou da Direito GV.
[1] Coordenadora do GEEF – Grupo de Estudos de Empresas Familiares da Direito GV/GVLaw. Advogada Parceira em Projetos de Governança Corporativa e Familiar do Escritório Carvalhosa e Eizirik. Sócia fundadora da Interlink Governança Global. É Doutora em Direito Empresarial pela USP, professora da Direito GV, foi Membro do Conselho de Administração do IBGC – Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. Relatora do Guia de melhores práticas de governança para empresas fechadas. Autora de livros e artigos jurídicos e de Governança Corporativa e Familiar.
[2] Escola de Direito da Fundação Getulio Vargas (FGV Direito SP).
[3] http://direitogv.fgv.br/grupos/grupo-estudos-empresas-familiares.